Guia da reforma trabalhista: confira as principais mudanças na legislação

Por Redação Onze

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A reforma trabalhista de 2017, realizada durante o governo de Michel Temer, buscou modernizar parte das regras do principal conjunto de normas trabalhistas, a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), criada em 1943 durante o governo de Getúlio Vargas.

Durante esse período de 74 anos, entre 1943 e 2017, muita coisa mudou e algumas normas acabaram se tornando defasadas.

Este artigo analisa quais foram as principais mudanças feitas nessa reforma e o que ainda precisa ser alterado na CLT e em demais normas trabalhistas para adequá-las aos tempos atuais e às demandas tanto dos empregadores como dos empregados – assim como dos autônomos e de todos os outros profissionais.

Em que contexto foi aprovada a reforma trabalhista?

Na época em que foi promulgada, o país passava por um momento de crise econômica e política, com uma grande taxa de desemprego e instabilidade institucional.

O governo Temer, em seu segundo ano após o impeachment de Dilma Rousseff, sofria com o baixo apoio popular. Para se ter uma ideia, em julho de 2017, uma pesquisa feita pelo Ibope apontou que apenas 5% dos brasileiros consideravam o governo bom ou ótimo, pior índice da história.

Se por um lado a criação da CLT foi uma grande conquista para os trabalhadores, assegurando uma série de direitos que antes não tinham regulação, a reforma trabalhista de 2017 teve como principal objetivo tornar as relações de trabalho menos engessadas, facilitando a terceirização e permitindo a contratação de trabalhadores de forma intermitente, por exemplo.

Com as medidas implementadas, o governo buscou melhorar o índice de desemprego e tentar contornar a crise econômica que afetava o país.

Para Fabio Medeiros, especialista em Direito do Trabalho e advogado do escritório Lobo de Rizzo, a reforma trabalhista de 2017 é considerada um marco para o Direito do Trabalho em virtude das mudanças que trouxe.

“Embora a CLT tenha mais de 900 artigos, apenas 10% deles foram afetados pela reforma trabalhista, sendo que grande parte das alterações podem ser consideradas fundamentais para que o Direito do Trabalho acompanhe a evolução da nossa sociedade ocorrida desde 1943, quando a CLT foi editada”, afirma.

Quais as principais mudanças da reforma?

  • Trabalho intermitente

Com a reforma trabalhista, empregadores passaram a poder contratar empregados para trabalho intermitente, no qual a prestação de serviços não é contínua. A alternância de períodos de atividade e inatividade podem ser determinadas em horas, dias ou meses.

2) Tempo de trajeto para o trabalho

O período de deslocamento entre a casa e o trabalho deixou de ser considerado tempo à disposição do empregador quando o trajeto não é servido por transporte público ou o local da empresa é de difícil acesso; antes da reforma trabalhista esse tempo no itinerário ao trabalho era considerado parte da jornada de trabalho e poderia gerar direito a horas extras

3) Teletrabalho

A reforma trabalhista regulamentou o regime de trabalho remoto, quando o profissional trabalha fora da empresa usando tecnologias de comunicação e informação. Embora o teletrabalho já fosse utilizado, com a reforma trabalhista os empregadores passaram a ter maior segurança jurídica para atuar sob esse regime.

Caso o empregador e empregado acordem o teletrabalho na forma da CLT, prevendo o regime no contrato de trabalho, é necessário que seja fornecida a infraestrutura e os equipamentos para o trabalho à distância, entre outras obrigações.

Ao empregado, não se aplicam as regras de jornada de trabalho, como controle de horários de trabalho e intervalos e remuneração por horas extras.

4) Empregado autossuficiente

Os empregados com curso superior e salário pelo menos igual a duas vezes o limite máximo dos benefícios da Previdência Social (R$ 12.202,12), podem negociar determinadas condições do contrato de trabalho diretamente com o empregador, sem a necessidade da participação do sindicato, como banco de horas anual, redução do tempo de intervalo para refeição para 30 minutos e a remuneração por produtividade ou desempenho individual.

5) Prêmio superação

O empregador pode, por liberalidade, premiar os empregados (individualmente ou em grupos) com bens, serviços ou valor em dinheiro em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades. Como o pagamento não gera encargos trabalhistas ou previdenciários, mesmo quando é pago habitualmente, o prêmio superação surgiu como uma boa alternativa para engajar e reconhecer os méritos dos empregados com melhor desempenho.

6) Banco de horas semestral

Empregados e empregadores podem definir o creditamento de horas para compensação em até seis meses, sem a necessidade de participação do sindicato ou de pagamento de adicionais de horas extras.

7) Fim da contribuição sindical obrigatória

A reforma trabalhista estabeleceu o fim da contribuição sindical compulsória na qual os empregados pagavam o equivalente a um dia de salário por ano e os empregadores pagavam as contribuições patronais em percentuais de seus capitais sociais. As contribuições seguem possíveis, mas apenas por vontade dos empregados e empregadores.

8) Acordo para término do contrato de trabalho

A partir da Lei 13.467/2017, os empregados e empregadores passaram a ter direito de terminar os contratos de trabalho por acordo. Nesse caso, além das demais verbas rescisórias, o empregador paga apenas metade da multa de 40% sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do aviso prévio indenizado. O empregado pode sacar 80% do respectivo FGTS e não tem direito ao seguro-desemprego.

9) Negociado sobre o legislado

O art. 611-A da CLT passou a prever que as convenções e acordos coletivos de trabalho prevaleçam sobre a lei em uma série de situações como aquelas mencionadas para os empregados autossuficientes, tornando as negociações mais flexíveis.

10) Tabelamento dos chamados danos morais

As indenizações decorrentes de danos extrapatrimoniais, mais conhecidos como danos morais, que antes podiam ser definidas subjetivamente pela Justiça do Trabalho, após a reforma trabalhista passaram a ter um parâmetro: de 3 a 50 vezes o salário do empregado, conforme a gravidade de dano apurada pela Justiça do Trabalho.

11) Sucumbência no processo trabalhista

As partes, empregados ou empregadores, continuam livres para moverem ações perante a Justiça do Trabalho, mas com a reforma trabalhista podem ser condenadas a pagar custas (2% sobre o valor do pedido) e honorários advocatícios (de 5% a 15% sobre o valor do pedido) à parte que for vencedora.

12) Dispensa coletiva e homologação de términos de contrato de trabalho

Os empregadores ficam livres para dispensar seus empregados individualmente ou coletivamente sem a necessidade de envolvimento dos sindicatos, nem mesmo para homologar os termos de rescisão dos contratos de trabalho.

13) Maior delimitação do tempo à disponibilidade do empregador

A reforma trabalhista determinou que não conta como tempo à disponibilidade do empregador, não sendo devidas horas extras, o tempo em que o empregado ficar na empresa após a jornada regular por causa de más condições climáticas, insegurança nas vias ou para realizar as seguintes atividades: práticas religiosas, descanso, lazer, estudo, alimentação, atividades de relacionamento social, higiene pessoal, troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa.

14) Prescrição intercorrente de ação judicial trabalhista

Outra mudança trazida foi o prazo de dois anos para que haja a prescrição intercorrente, que ocorre quando o processo não é concluído em função de inércia da parte, sendo que o prazo tem início quando o autor da ação deixa de cumprir determinação judicial.

15) Aumento da multa por manter empregado não registrado

Embora esse artigo já existisse, o valor da multa era definido em unidades fiscais de referência, padrão que foi extinto. Após a extinção, o valor dessa multa ficou em R$ 402,53 desde o ano 2000, sendo aumentado para R$ 3 mil com a nova reforma trabalhista.

16) Nova multa no caso de não serem anotadas informações na carteira de trabalho

Outra novidade que a reforma trabalhista trouxe foi uma multa administrativa de R$ 600 no caso do empregador deixar de fazer anotações na CTPS como período em que trabalhou, férias, acidentes de trabalho, dentre outras.

Quem saiu mais beneficiado com a reforma trabalhista?

Ao analisar os principais conteúdos da reforma trabalhista, existe uma quantidade maior de normas que beneficiam os empregadores.

Ao tornar a contribuição sindical não obrigatória, por exemplo, isso levou a um enfraquecimento da representação dos trabalhadores por instituições que historicamente sempre lutaram pela expansão dos direitos dos trabalhadores. Medeiros, no entanto, não vê dessa forma.

“A chamada reforma trabalhista beneficiou as duas partes da relação de trabalho, empregados e empregadores. Naquele momento em que a lei foi editada, a taxa de desemprego era de 12% (12.6 milhões de desocupados) e grande parte da sociedade via a CLT, com suas normas baseadas em enunciados de 1943, como um dos fatores impeditivos para a geração de emprego e trabalho”, afirma ele.

Diante desse fato, na medida em que a Lei 13.467/2017 atualizou a CLT para refletir melhor as relações de trabalho dos dias atuais, todos teriam ganhado com isso.

“Se você analisar em detalhe todos os efeitos possíveis decorrentes das mudanças via reforma trabalhista, você irá identificar que o fio condutor não foi beneficiar uma parte ou outra, mas sim propiciar que as partes possam negociar condições mais favoráveis, menos burocráticas e até mesmo com menos custos, possibilitando que os empregadores possam gerar mais empregos e os empregados possam se empregar nessas novas vagas geradas”.

Qual foi o impacto da reforma trabalhista sobre a questão de processos trabalhista?

Dentre as muitas mudanças realizadas pela reforma trabalhista, a questão da sucumbência (valor pago por quem perde a ação) ajudou muito em fazer com que as partes da relação de trabalho, empregado e empregador pensem melhor antes de partir para aventuras judiciais.

Segundo Medeiros, a queda no número de ações trabalhistas distribuídas a partir de 2018 é uma prova disso, já que as partes foram forçadas a ser mais conscientes e realistas em relação aos seus pedidos e a atuação pelos advogados ganhou em técnica.

Em apenas dois anos, o total de processos trabalhistas recuou 32%, passando de 2,2 milhões em 2017 para 1,5 milhão em 2019, segundo dados do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Entre as mudanças processuais, Medeiros cita como uma das principais a provocada pelo art. 8º, § 2º da CLT, que estabeleceu que “súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo TST e pelos TRTs não poderão restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei”.

Essa mudança, no entanto, ainda não se encontra em pleno vigor pois são aguardados os os efeitos por meio de revisões de súmulas e orientações jurisprudenciais.

Quais pontos importantes não foram tratados pela reforma?

De acordo com Medeiros, existem questões importantes que não receberam a devida atenção pela reforma trabalhista, levada adiante pela Lei 13.467/2020. Dentre essas questões, podem ser citadas:

  1. O acidente sofrido pelo empregado no trajeto de ida e volta para o trabalho e pode gerar garantia provisória de emprego de 1 ano, caso o empregado receba benefício previdenciário por mais de 15 dias. Essa possibilidade havia sido revogada por medida provisória, mas está novamente vigente, representando riscos para o empregador já que ele fica responsável pelo empregado em um período em que ele já não está na empresa.
  2. O pagamento de auxílio alimentação, como os vales refeição e vales alimentação não são considerados salário ou remuneração para nenhum fim, mas não podem ser pagos em dinheiro. Ainda que fosse necessária a imposição de limites para coibir abusos, o pagamento em dinheiro desses benefícios não mudaria a natureza não remuneratória e reduziria custos para o empregador com intermediários na administração desses benefícios.
  3. Da mesma forma, a chamada unicidade sindical, que decorre da obrigação de que apenas um sindicato pode ser representante de determinada categoria em um determinado território também necessita de reforma urgente. Assim, empregados e empregadores poderiam escolher, coletivamente, aquelas entidades sindicais que melhor os representem, situação que certamente geraria representatividades mais legítimas e eficazes nas negociações coletivas.

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